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Renunciantes da herança, filhos não devem arcar com as dívidas do pai, decide TJRS

Os três filhos não devem arcar com as dívidas do pai decorrentes de uma execução judicial. Eles foram considerados parte ilegítima para responder pelo débito no redirecionamento da execução fiscal por terem renunciado à herança, restou apenas a mãe como única herdeira. A decisão é da 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul – TJRS.

Ainda que o artigo 1.997 do Código Civil (Lei 10.406/2002) diga que, uma vez feita a partilha, os herdeiros respondem pelas dívidas do falecido, na proporção que couber a cada um na herança, quem renuncia à condição de herdeiro não tem esta obrigação, como prevê o artigo 1.805 também do Código Civil.

Os autores da ação contestavam a decisão da Vara Judicial da Comarca de Ibirubá. Para o juízo local, os herdeiros deveriam permanecer na execução, já que aceitaram tacitamente a herança e, logo após, cederam os direitos hereditários à mãe. “Assim, os herdeiros cedentes respondem até o limite do seu quinhão hereditário, razão pela qual indefiro os pedidos”, escreveu no despacho o julgador.

Contudo, os filhos argumentaram que cederam gratuitamente os seus direitos hereditários à mãe, nada recebendo, portanto, após a partilha. Salientaram que a cessão gratuita equivale à renúncia da herança e, assim, não são responsáveis por dívida contraída pelo autor da herança.

Renúncia de direitos

Em decisão monocrática, o desembargador responsável pelo agravo de instrumento no TJRS deu provimento, de plano, ao recurso, em consonância com a “jurisprudência paradigmática” da Corte.

Para o magistrado, a decisão contestada pelos três filhos tem “densidade suficiente” para causar dano patrimonial concreto e de difícil reversão a eles. Destacou ainda que os agravantes-cedentes são equiparados a renunciantes, logo, não podem responder pelas dívidas do falecido pai, pois nada receberam a título de herança.

Os agravantes comprovaram a cessão gratuita dos direitos hereditários em favor da viúva meeira, que tem direito a metade do patrimônio do cônjuge falecido, em julho de 2007, por meio de escritura pública, sendo que a partilha foi homologada judicialmente. O entendimento foi de que a cessão gratuita dos direitos hereditários em favor do co-herdeiro equipara-se à renúncia.

Questões basilares do Direito Sucessório

Segundo Mário Delgado, presidente da Comissão de Assuntos Legislativos do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, a decisão está correta e aborda duas questões que são basilares do Direito das Sucessões.

“A primeira diz respeito ao que antigamente se chamava ‘benefício de inventário’, e hoje é traduzido em regra expressa do Código Civil segundo a qual o herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança (artigo 1.792). Não se confundem os patrimônios do autor da herança e do herdeiro. O herdeiro não responde pelas dívidas do falecido, senão nos limites daquilo que ele recebeu de herança”, explica o especialista.

Ele acrescenta: “A segunda questão diz respeito ao direito potestativo de qualquer herdeiro de renunciar à herança. Ninguém é obrigado a herdar, salvo se a renúncia tiver por objetivo lesar credores do próprio herdeiro”.

Dívidas que extrapolam herança

“As dívidas em questão não foram contraídas pelo herdeiro. São dívidas do falecido e o herdeiro não está obrigado a arcar com elas. É a herança que responde pelo pagamento das dívidas do falecido, conforme previsão do Código Civil (artigo 1.997)”, frisa Delgado.

As dívidas do falecido, mesmo que ultrapassem o total da herança, não podem atingir o patrimônio pessoal dos herdeiros, como explica Mário Delgado. “Se são dívidas do morto e não dos seus herdeiros, somente a herança responde por elas. Mesmo se não tivesse havido renúncia, os herdeiros só pagariam nos limites daquilo que receberam.”

“Entretanto, caso não renunciem e recebam a herança, caberá a eles provarem que há excesso, ou seja, que as dívidas superam forças da herança. Essa prova será dispensada se tiverem renunciado ou se, no inventário, ficar comprovado o valor dos bens herdados e o montante das dívidas, para se determinar qual o limite da responsabilidade dos herdeiros pelas dívidas do falecido”, destaca o especialista.

O advogado pontua que, caso as dívidas fossem do próprio herdeiro e ele renunciasse à herança a que faria jus, então os seus credores poderiam forçá-lo a aceitar ou mesmo aceitar a herança no lugar dele. “Nesse caso, os credores assumirão o lugar do herdeiro para se pagarem, e o que sobrar é devolvido ao monte mor da sucessão.”

Pacto antenupcial

Entre as polêmicas que circundam a renúncia à herança está o pacto antenupcial. Segundo Delgado, muitos autores sustentam que tal acordo não pode ser usado para esses fins, eis que a renúncia à herança só poderia ocorrer após a abertura da sucessão.

“Entendo que é possível a renúncia em pacto antenupcial, não à herança propriamente dita, mas a determinados direitos sucessórios, como é o caso do direito concorrencial de cônjuges e companheiros, ou seja, o direito de concorrer com os filhos do outro, nas hipóteses em que a lei permite”, opina Delgado.

Fonte: IBDFam



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